12.12.11

Não te encontro. Procuro como nunca. Na rua, em casa, nos cafés que frequentavas, dentro de mim. E aí, parece que te vejo. Não te encontro, não me é possível estabelecer uma conversa nem mesmo dar-te um abraço. Não, isso é demasiado. Morres-te pai. Eu sei disso. E parece que já não me custa escrever estas palavras. O que me custa é já não as poderes ler, que não possas partilhar nada comigo, nada. Sabes o que é nada nesta vida? É eu acordar e querer ver o teu olhar de orgulho, ver o teu sorriso de pai, tão familiar, mas já tão longínquo, tão desfocado. Não que não me lembre, mas não me quero lembrar. Dói. Quando olho à minha volta e não te vejo. Sei que não estivemos sempre juntos, mas eu sabia que estavas lá, que te podia encontrar. Hoje já não te encontro. Só em mim. Nos meus traços, na minha cobardia, na minha dificuldade de viver, na minha depressão, na cor dos meus olhos. Aí vejo-te. Sou parte de ti. Talvez a única coisa que deixaste neste mundo que realmente te pertencesse. E eu sei que me amavas, mas deixaste-me pai. Não querias, mas deixaste-me. E hoje lembro-me dos nossos dias felizes, esqueço os outros que não merecem ser lembrados. Lembro-me de me pores os pés nos teus e carregares-me assim, como se me pudesses levar a qualquer lugar do mundo, como se me pudesses apagar todos os problemas daquela forma. Recordo-me como me chamavas "filhinha" e fazias uma festa na cara num gesto de carinho. E tudo isso me falta. Toda essa protecção que já não encontro com apenas 17 anos mói-me por dentro. Porque pai, eu tenho tanta coisa para te contar desde que foste, tanta. Mas tu já não sentes, já não me ouves. Viveste pouco, mas tão intensamente. Não da melhor forma, nunca te encontras-te, nunca encontraste paz. E assim foste embora, com o olhar vazio, sem nunca ter sentido felicidade completa. E por isso me culpo. Queria ter estado lá todos os dias. Mas não me foi possível. Como? Como iria eu ver parte de mim morrer aos poucos? Mas vi-te ir. Doeu. E hoje o que posso dizer mais? Só posso e tenho de fazer-me uma mulher. É importante que esta parte de ti que ficou possa fazer a tua vivência valer a pena. Vou deixar a cama, vou deixar a dor, deixar este turbilhão de emoções que já não controlo, deitar fora a depressão que não me liberta. Mas desta vez vou ser eu a libertar-me. Por mim. Por ti pai. Por nós.

10.12.11

verdade

Como um comboio de corda a minha vida é alimentada por um combustível manual, uma escolha, uma lágrima, um sonho. A verdade é que sinto, sempre, e cada vez mais a tua mão na minha vida, um sorriso teu é um sol que me cumprimenta; um abraço uma folha de outono que rodopia num parque triste. Tens o efeito dum pincel numa tela na minha vida, pintas, esborratas e escolhes tons diferentes para me mostrares novos mundos. O que chegou a ser uma ilusão, uma suposição, um livro por abrir é agora a história que me descreve e tu ilustras a capa. Gosto de te olhar e ler os teus olhos, como se de letras se tratassem, és um enigma para muitos, mas para mim és simples como oxigénio. Gosto de te respirar, e sentir-te no meu sangue quente. Não tenho muitos interesses, mas se tenho alguns tu és sem dúvida o meu preferido. E não é um cliché. Um amor de novela, uma paixão de cinema. É apenas e só a verdade. A nossa verdade que abraçamos porque não há outra, nem poderia haver. É um reflexo, quase um hábito ou uma rotina. Mas não das más que apetece quebrar. Não, é daquelas que merecem ficar, é oficial, é digna de ser repetida e relembrada. Porque sabe renovar-se permanecendo sempre a mesma, com a mesma cara, a da pureza. Mas este sentimento a que chamamos amor é muito sério, muito formal. O amor, o casamento, a casa de férias. Tudo compromissos. Quando na verdade esses elos que se formam são muito mais que títulos, tal como capas de livros são apenas o embrulho de uma sensação tão natural e espontânea que nos proporciona a vontade de abraçarmos uma pessoa para sempre. Para mim é isso que é o amor. É acordarmos de manhã, olharmos para lado e sentirmos carinho por cada um dos traços daquela pessoa, muito mais nesse dia do que no dia anterior. E assim dura uma vida. É dessa forma que eu penso que vivem aqueles casais de velhinhos que vejo no parque. Talvez já saibam de cor as rugas um do outro, mas amam-nas como se não houvesse nada mais lindo e precioso na vida. Há quem diga que sonho muito, que imagino demasiado. Eu não acho, acho que a vida é simples. Por isso é que digo que te quero abraçar para o resto da vida. Só.

26.1.11

num ano a minha vida mudou muito.

foi o meu melhor e pior ano ao mesmo tempo. mas sei que cresci, e que sinto que este presente me leva realmente a um futuro bom. tomei a melhor decisão da minha vida, mas também perdi parte de mim pouco tempo depois. apesar de tudo, e de tudo o que sofri, posso dizer que consegui encontrar uma forma de sorrir, de me acalmar, de olhar nos olhos de quem amo, e encontrar esperança e alivio. agora? agora quero ser feliz.

27.11.09

informação de ultima hora.

um,
dois,
três,
quatro,
dias, para voltar para Portugal.

26.11.09

o amor também morre.

a cada passo teu a madeira do solo estremecia; entre a luz da madrugada, era inverno. sentei-me no sofá verde da sala à tua espera, como que se adivinhasse. queria ver a cor dos teus de perto. mas, apesar daquele som desigual da tua marcha repentina, o teu arrependimento sobreveio quando menos esperava. logo regressaste ao quarto de hóspedes, onde tens dormido. mas a cobardia passou-te depressa, pois passados alguns segundos senti o teu cheiro invadir-me; estava tudo tão calmo, a luz entrava em zig zag por entre as persianas semi-fechadas, não se ouvia ruído nenhum. vi-te de longe na sombra da vergonha, estavas tenso, fechado, se não te conhecesse diria mesmo que estavas assustado. as tuas pernas tremiam e mais uma vez todos os teus movimentos eram reproduzidos musicalmente nas tábuas de madeira do chão. e mal cruzei o teu olhar verifiquei a dor louca nele guardada, dançava em camera lenta só para furar mais fundo. mas, eu sabia porque estavas assim, só queria aparentar que não, e deixar-te ali num remoinho de pensamentos claustrofóbicos. desejava que vivesses aquilo que eu tive de viver. mas eu não fui cobarde, tu és. que agonia, o teu pensamento corria de um canto para o outro da sala, com movimentos energéticos pelo caminho; mas o teu corpo, acanhado, ficava plantado ao chão, sem qualquer estabilidade devido ao tremor da tua alma. a verdade, é que quem trai não sabe consolar. percebi isso. mas nem uma palavra, não percebo. fui eu que fui traída, e tu o infiel, não queiras trocar os papeis.

24.11.09

pai,

não consigo, é demasiado.

26.9.09

tenho saudades tuas.

escrevi esta frase banal, mas aquilo que sinto está longe de o ser. tenho. é uma sensação de te ter perdido, de te teres ido embora, mas de teres deixado aqui o pó da tua vida; os fragmentos do teu passado; as pegadas do teu caminho. um sentimento que quando prolongado fura e vai moendo até doer. porque eu bem sei, o quão importante eras para mim. aquilo que significavas, aquilo que importavas. avô, queria que ainda estivesses aqui. queria que a clareza dos teus olhos cinzentos olhassem para a clareza dos meus olhos verdes, e pudessemos comparar algumas parecenças. queria conhecer-te melhor. queria saber porque morreste. e morrer porque? podias ter ido viajar, voltar às raízes, ires ver o tu país, a angola. ou ir morar uns tempos para a guarda, para recordar. morrer é muito. é dizer adeus. sem nem sequer dizer. porque a ultima vez que te dei dois beijos na cara e te perguntei "como vais, avô" não sabia que essa iria ser a ultima vez. morrer porque? passar de morto a vivo, assim, em segundos. queria-te aqui. a verdade é que nem aproveitei enquanto te tinha. sei lá. falávamos pouco. mas eu lembro-me bem de ouvir os teus passos fortes ao descer as escada na vossa casa, e quando te punhas a passar a ferro as tuas camisas brancas. lembro-me. e quando os teus olhos sorriam quando sabias que tinha boas notas, e dizias que eu tinha de ser sempre assim. eu sei que, apesar de nunca me teres dito, tinhas orgulho em mim. e eu em ti, avô. homem grande e forte, que ultrapassou tudo, fugiu do pais do coração para proteger a família da guerra. e eras assim, calmo. gosto de ti. quero-te aqui. tenho saudades tuas.