A ultima carta:

Nada. Eu sei, e já várias vezes repeti que nada direi. Nada. Não, não vou citar, nem relembrar 20 anos de vida, já nem sei por onde eles pairam. Eu já sei, eu já te esqueci e apaguei todas as memórias e o teu (nosso) amor não me toca mais, já fiz o que me pediste, não me lembro de nada nem das canções que tocavas, e do cheiro que libertavas. Sou eu. Mas sem ti. Perdi um bocadinho do meu verdadeiro eu. Mas sou eu. Fiz e voltei a fazer, queimei as cartas, com fogo e com o coração. Podres, estão as maçãs da arvore que plantámos, sim. Eu deixei-as apodrecer, como me pediste. Vendi aquelas medalhinhas que me ofereceste, juntaste tantos réis para a poderes comprar, mas eu vendi-as. Sim, eu sei que tenho de te mandar o dinheiro delas, amanhã irei aos correios, vais ter o teu dinheiro sujo, das minhãs mãos, mas eu não me importo, oh, não. Mas não me culpes, eu já te esqueci, mas há gestos que ficaram cá, tenho demasiadas márcas tuas, mas já não me lembro nem de metade. Falei, já falei com ele, já lhe disse que te foste embora. Ele chorou, mas depressa se pôs de pé para um grande abraço me dar, eu sei, que desprezas as pequenas demontrações de afecto, mas, que porra, foi preciso, e o miudo está orfão de pai. Sim, está orfão ! Não vais voltar, e eu nem quero que voltes, não voltes. Eu já arranjei uma mala para te mandar o resto das roupas, não te preocupes que estão lá todas, não as passei, não te esqueças que a tua mulher agora tem vinte anos e 2 dedos de testa, não sei se saberá passar uma camisa, também não quero saber, isso te juro. Sim, eu sei, pareço bem forte, não é. Sim, eu sei, já estou bem melhor, para mim já não existes, foste uma fase longa da minha vida, mas não me vou limitar a isso, és demasido pequeno, não quero que sejas tu a ditar o resto da minha vida. O futuro , é meu. Eu estou preparada, e aqui te digo, esta é a ultima carta, as ultimas palavras que te direi, não mais estarás na minha mente, vais deixar de te passear no meu coração, como um ladrão fugitivo, assim me despeço. Adeus, vive bem a tua (antes nossa) vida.A (já não) tua Mariana.